A arte de parir a si mesma

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Hoje é o Dia Internacional da Mulher. Eu, que passo desatenta pela maior parte das datas “oficiais”, hoje não.

Nesta segunda-feira, a  responsabilidade e a força de ser mulher estão inflamadas no meu corpo. Ao invés de pus, expurgo palavras.

Gestar.

Minha primeira revelação foi saber gestar palavras. Depois meus dois filhos. Depois peixes.

A lição aprendida é que gosto do gestar. O cultivo, a nutrição necessária.  A espera acalma meu ritmo inquieto. O movimento dentro torna-se suficiente.

Eu fui uma menina estranha. Conversava com as ondas do mar.  Gostava de ficar a sós com minha imaginação.

A vida me despertou a extroversão, mas gestar traz de volta esta Leticia mais quieta, mas consigo. 

Parir:

Sempre fiz da minha criatividade, alavanca. Alavanca para tentar o novo. Alavanca para desafiar padrões. Alavanca para sustentar minha diferença versus as expectativas do outro (e da outra).

Por isso gerar e parir e criar são todos verbos na minha oração.

Tenho a coragem suficiente de suportar as dores de parir. Desde crianças até novos capítulos de minha vida.

Sustentar escolhas pouco ortodoxas. Ir contra a corrente.

Apenas outro dia, uma amiga da adolescência me contou que meu pai sempre elogiava minha autonomia. “Nunca dependeu de homem nenhum” nas ocasiões em que se esbarravam na esquina do bairro onde eram vizinhos.

Acho curioso e oportuno meu pai, que sempre enfrentei com minha ousadia e irreverência, me mandar esta recado póstumo.

Nunca minha coragem foi tão testada. Porque mulher, para enfrentar o mundo, tem que se fazer duas vezes maior.

Machucam-me o peso de fazer-me maior por fora, do jeito homem de ser maior. Falar mais alto. Mais forte. Por cima da outra fala.

Aprendo a fazer-me maior por dentro. No silêncio e sabedoria de sacerdotisa.

Florescer

Um desafio de ser mulher é sustentar a sutileza do feminino sem se tornar vítima de predadores.

Cultivar o sensível de olhos abertos. Penélope 1 x 0 Barba Azul.

Sucessivos mergulhos para dentro me revelaram pérolas-talismãs.   A rede de apoio de outras mulheres. A parceria com homens sábios.  O saber alternar o corpo muscular com o corpo que fala baixo e ganha tempo, como Sherazade.

Florescer, para além de compreender o alimento que nutre a alma, é fazer-me mais íntima da humildade, do perdão.

Difícil, quando crepitam fogos da raiva e me afogam águas do ressentimento. Persisto.

Tento ser gentil comigo e com o interlocutor, mesmo que por vezes adversário.

Frutificar

Da flor virá o fruto.

O filho que torna-se um homem bom. A filha que torna-se uma artista inteira.

O amor maduro que é pavimento para novos sonhos.

A jornada de semear humanidade nos corações e escritórios.

As palavras que derramo aqui e acolá, na esperança de um mundo de olhos, asas e corações abertos.

 

Ser mulher. Dor, delícia, mas jamais tédio. Renovar-se fênix de dentro do próprio ventre.

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